O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) identificou uma mudança no mercado de compras internacionais até US$ 50 após a criação do Remessa Conforme, o que tem inspirado maior cautela na decisão de taxar ou não essas mercadorias —hoje isentas de Imposto de Importação.
O diagnóstico preliminar indica uma queda consistente tanto no volume quanto no faturamento desses produtos, com substituição de parte da oferta por artigos de fornecedores nacionais.
O temor é que a tributação adicional interfira no esforço de regularização das plataformas estrangeiras e comprometa, já na largada, um movimento visto como positivo e que poderia favorecer empresas locais. Na visão do Executivo, esses negócios já têm se beneficiado da maior colaboração dos chamados marketplaces (grandes lojas digitais, que pequenas empresas podem usar para vender seus produtos em troca de remuneração).
Segundo um interlocutor do governo ouvido pela Folha, se antes a administração pública encarava as empresas como "fora da lei", o atual ambiente de colaboração requer do Executivo uma postura semelhante, tratando as companhias agora como contribuintes.
Entre as empresas que aderiram ao Remessa Conforme desde agosto de 2023, quando ele foi lançado, estão as estrangeiras Shein, AliExpress e Shopee. O programa corta a zero o Imposto de Importação de remessas destinadas a pessoas físicas com valor de até US$ 50, além de dar prioridade a esses bens no despacho aduaneiro. Em contrapartida, a companhia se compromete a seguir as regras da Receita Federal.
A taxação das compras internacionais até US$ 50 tem
sido colocada por integrantes do Congresso Nacional como sugestão para
compensar as perdas de receita com a manutenção da desoneração da folha
de 17 setores da economia e das prefeituras.
Uma ala do governo não
faz oposição à medida, nem descarta sua adoção. O vice-presidente
Geraldo Alckmin (PSB) já disse que a retomada do imposto seria "o
próximo passo" a ser dado pelo governo.
No entanto, a mudança no mercado tem servido de
justificativa para outra ala recomendar maior prudência nas discussões,
que também são sensíveis politicamente.
No ano passado, a Fazenda
chegou a instituir a cobrança da alíquota sobre as compras
internacionais de até US$ 50, mas a reação significativa à medida forçou
um recuo.
Na época, a primeira-dama, Rosângela Lula da Silva, a Janja, atuou diretamente na articulação para reverter a cobrança. Ela passou a ser invocada por usuários críticos à medida nas redes sociais para comentar o tema. Segundo aliados, Janja teve influência na decisão de Lula de reverter a cobrança.
Até agora, apenas os estados implementaram a cobrança de uma alíquota uniforme de 17% de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre esses produtos.
Na avaliação de técnicos, a certificação das empresas e a cobrança do tributo estadual já foram suficientes para alterar de forma significativa o quadro das compras importadas de menor valor.
O Banco Central apontou um recuo de 39,4% no valor em dólar das importações de pequenas mercadorias em novembro de 2023 ante igual mês do ano anterior. No acumulado do ano até novembro, o recuo foi de 11%.
Dados mais detalhados ainda serão apresentados por técnicos do Ministério da Fazenda ao ministro Fernando Haddad, mas a avaliação é de que o quadro atual é bem diferente da "sangria desatada" identificada antes do programa de certificação dos marketplaces.